julho 16, 2007

Open your eyes

(são repetidas estas notas do começo, feito coração batendo em nervosismo, com medo, ou correndo. Ainda estou calma. Ainda está frio, e apesar das camadas e camadas de roupa que visto, o vento dá um jeito de trespassar por entre as costuras até chegar na minha pele. Cortante, o frio. Afiado, o vento. Queria não precisar usar tanta roupa. Queria não me sentir tão mal assim. Queria que não estivesse tão frio. Queria poder estar correndo agora, sem preocupação, sem horário, sol batendo na cara, sentindo o chão contra meus pés, sem engasgar ou ter que parar para respirar. São tantos os quereres que até me perco quando me entra a voz masculina, mas suave, pelos ouvidos.)

All this feels strange and untrue
And I won't waste a minute without you
My bones ache, my skin feels cold
And I'm getting so tired and so old


(É sobre morte, a música. Acho que sim. A pele fria só pode ser sobre morte. Minha pele ainda está fria. O céu está tão claro que chega a arder, the day, so crispy it hurts, e eu me distraio com as pedras do chão, todas fora de alinhamento, fora do lugar, saltadas, empurradas para cima por causa das raízes das árvores. Seculares árvores. Do alto destas árvores algumas décadas, talvez um século, me contemplam. Quando a cidade ainda fazia sentido, quando a vida ainda tinha uma certa ordem, quando viver ainda fazia sentido. Quer dizer, houve tempo em que viver fazia sentido? Não para mim.
Não há mais nada em volta, porque o som que me invade não deixa chegar mais nada. Aliás, se não prestar atenção, não vou entender. E agora eu quero entender, porque as imagens que a música vai formando na minha mente me assustam um pouco. Muito sangue, sangue muito vermelho, num piso gélido, muito branco.)

The anger swells in my guts
And I won't feel these slices and cuts
(É, definitivamente é sobre morte. Quem será que morreu, ele ou ela? No clipe aparece alguém percorrendo ruas vazias de uma cidade fria. Tão fria quanto hoje, mas não tão seca. Entra cortante o ar pelas narinas, chega a doer o pulmão, a garganta falha, quer tossir, a secura do ar piora tudo.)
I want so much to open your eyes
'Cause I need you to look into mine
(ele morreu, e agora espera que ela abra os olhos porque não tem certeza. E ele precisa ter certeza. Eu preciso ter certeza de tantas coisas, sabe, tipo agora mesmo, indo pro médico, se é grave essa dor que me arrebenta o peito, me engole por dentro, me consome. Será que tem solução? Ou estarei eu também precisando que alguém me olhe para que eu não morra. Será o meu sangue derramado?)


Tell me that you'll open your eyes
Tell me that you'll open your eyes
Tell me that you'll open your eyes
Tell me that you'll open your eyes

(Repetição.
Como no verso do Frost, For I have promises to keep
And miles to go before I sleep
And miles to go before I sleep, que ao fim também é sobre morte. Foi Borges quem me ensinou, quanto mais repetido, maior a intensidade, maior a tensão, wider the meaning. Open your eyes wide, provavelmente ele pensou em dizer, mas o verbo não coube, não teria métrica, ou ritmo, ou dessas coisas que tornam algumas músicas extremamente belas e outras apenas passáveis.
Será que é isso, então, ele grita para ela, me dê certeza de que está tudo bem ao abrir os olhos, e depois, apenas diga que eu ficarei bem, me olhe, me veja, e depois, mostre-me que ainda há vida em ti, deixa-me ver em teus olhos a tua alma, e por último, em súplica, me veja, valide a minha vidacom teu olhar, não faça minha existência ser em vão, por favor, me enxergue.)

Get up, get out, get away from these liars
(saia desta mesa, não dê ouvidos a todos esses que dizem que eu morri, que eu não existo mais, me procure, estenda tua mão, reach out for me, don't give up on me now...)
'Cause they don't get your soul or your fire
Take my hand, knot your fingers through mine

(uau, não é um simples me dê a tua mão, é um entrelaçar de dedos, pra ter certeza de que nem eu nem tu escorregaremos. Que lindo.)
And we'll walk from this dark room for the last time
(Queria estar agora bem longe. Queria estar em casa. Queria poder viajar, ter dinheiro pra levar meus amigos junto, ter dinheiro pra não me preocupar mais com dinheiro. When money is no longer an issue, everything else is possible, isn't that what they say?)

Every minute from this minute now
We can do what we like anywhere
I want so much to open your eyes
'Cause I need you to look into mine
(ah, a liberdade de não mais se estar. A liberdade de apenas ser. Quando é que eu vou chegar lá. The bliss of being, only. Estou com sede, agora. Meus lábios estão machucados da febre da noite anterior e do vento de agora. Já estou chegando, já estou chegando, é só dobrar esta esquina - quanto pó nesta cidade, que me arranha a garganta e torna ainda mais difícil respirar - e caminhar mais um pouco. Falta pouco, falta pouco.)

Tell me that you'll open your eyes
(uma)
Tell me that you'll open your eyes
(duas)
Tell me that you'll open your eyes
(três)
Tell me that you'll open your eyes
(quatro)
Tell me that you'll open your eyes
(cinco that you'll open your eyes)
Tell me that you'll open your eyes
(that you'll open your eyes)
Tell me that you'll open your eyes
(xii, perdi a conta. Deve estar no oitavo ou nono verso. E devo também estar cantando muito alto, as pessoas me olham como se eu não fosse humana, como se eu não fosse, como eles, feita de carbono, hidrogênio e sangue e sonhos. Deve ser a fumacinha que sai da minha boca, deve ser isso, a minha garganta dói demais e estou rouca demais pra conseguir cantar alto a ponto de chamar a atenção. Até porque, numa cidade como esta, em dias como os que correm, o que exatamente ainda chama a atenção das pessoas?)
Tell me that you'll open your eyes
(quanto desespero, quanta angústia)

All this feels strange and untrue
And I won't waste a minute without you
(o coração continua batendo ao fundo. Se tivesse um pouco de habilidade musical, saberial dizer quais notas estão tocando, mas na minha ignorância soam apenas como um coração acelerado, com pressa, correndo, aflito e sem rumo. Agora que cheguei é o meu batimento que acelera. Não gosto daqui, definitivamente não gosto. Todas as vezes em que precisei não encontrei o alívio que precisava. Por que agora deveria ser diferente? Tomara que não demore. Só quero chegar logo em casa, sei que vou me sentir melhor assim que chegar em casa. Que sede.)

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