janeiro 14, 2008

The heart of the matter




Saiu hoje no Jornal Nacional que os médicos já conseguem criar um órgão completo a partir de células-tronco.

Pelo que eu entendi, eles pegaram um coração de verdade, e excluiram tudo o que era músculo, deixando a "forma" das veias, artérias e outros tecidos em volta. Na foto parece que criaram mesmo uma fôrma, como se fosse um molde oco.

Em vez de cobre, como nas esculturas do Rodin, o preenchimento é feito com células-tronco, que começam a se reproduzir e "compreendem", pelo formato do órgão, o que é pra ser aquilo, e passam a criar os tecidos em volta das supostas artérias e veias. No caso do coração, começam, inclusive, a bombear o sangue. Fracamente, claro, mas é só porque é o início.

Inevitável perguntar se esse tipo de cirurgia promove um recomeço não só para a questão física do paciente como também sentimental, uma vez que é o coração o emblema máximo de sentimentos no simbolismo humano na totalidade (bem, maioria. Me lembro agora de ter estudado um povo, desses antigos, para quem o coração não estava ligado aos sentimentos. Mas, assim, posso estar enganada à esta hora da noite.) de povos e culturas.
E, indo mais além com o pensamento, seria possível imaginar um transplante de células-tronco com neurônios, principalmente os que armazenam as memórias indesejadas e ruins, tornando realidade o filme aquele em que uma empresa conseguia apagar lembranças específicas mediante solicitação do paciente, monitorando os caminhos das lembranças e o endereço de registro das vivências no cérebro. Claro que o método seria diferente do apresentado no filme, já posso ver a substituição de células específicas, e durante o tempo de reconstrução das sinapses, a pessoa passaria por um breve período de confusão e amnésia temporária, só o tempo de os arquivos das lembranças se reorganizarem e passarem para as células novas, que teriam em si espaços livres para novas memórias, novos registros, novos aprendizados.
Tá, é, muita viagem, eu sei. Mas até certo tempo atrás também achávamos coisa de ficção científica robôs, nanotecnologia e afins e hoje já é realidade. Quem pode me dizer que não será possível?
Ah, sim, e antes que alguém me pergunte, caso esse serviço de "apagamento" de memória, como no filme, ou de "substituição" de espaço de registro (que é como eu chamaria esse processo que envolve a troca dos neurônios com dados-memória que a pessoa não quer mais ter por células novinhas em folha com todo espaço disponível para novos registros), estivesse disponível, se eu seria uma cliente em potencial, não, eu não seria. Apesar de meus arrependimentos me trazerem sentimentos conflitantes - mágoas, tristezas, dores, raivas e afins -, não abriria mão de nenhum deles. Talvez um ou outro, de repente, em relação a decisões profissionais, uma ou outra palavra que eu gostaria de não ter dito.
Mas, ao fim da equação, se alguma dessas lembranças não estivesse em mim, se algum desses erros não tivesse me ensinado alguma lição importante, eu não seria quem eu sou hoje. E, sabe, eu gosto de quem eu sou hoje. Gosto do caminho, tortuoso e algumas vezes difícil, que me trouxe até aqui.
E por isso não mudaria nada. Muito menos meu coração. Mas fico contente com as possibilidades que essa experiência traz para muita gente.

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