dezembro 25, 2007

Abrindo uma pequena exceção

Nunca acreditei muito nas palavras que são repetidas incessantemente.

Tenho um tanto de desconfiança quando me elogiam, e tornam a elogiar dois segundos depois, e continuam, repetidamente, sem mudar o discurso.

Também nunca acreditei muito em todos que repetiram me amar num looping sem fim. Coisas como, ah, me passe o sal, te amo, ou então, que lindo corte de cabelo, te amo, sabe, sempre me pareceram um tanto falsas, como tinta dourada pra fazer de conta que é ouro. As palavras sempre me foram valiosas demais, e seus significados preciosos demais pra serem gastos e esgaçados e transformados em bijuteria barata e latão assim à toa.

Mas nem por isso deixei de me sentir amada. Meus pais, meus familiares, sempre demonstraram isso, sempre me deixaram muito à vontade, sempre me deram certeza desse amor com demonstrações e atitudes que fizeram crescer em mim uma segurança e uma confiança em mim mesma por causa desse amor.



Meus amigos, aquelas pessoas que eu mais estimo, e que me são importantes, feito obras de Fabergé cravejadas de safiras e diamantes, também se expressaram (e expressam), demonstrando afeição e respeito, confiança e entrega, que se sente muito mais com gestos, com atenções, com abraços e carinhos que com quaisquer combinações de palavras ou poesias que possam ser escritas.

Ok, ok, eu acho bonito dizer, acho bonito escutar também. Mas acho desperdício usar sem moderação, acho desgastante, como usar maquiagem demais, ou uma árvore de Natal com todas as luzinhas e todos os penduricalhos de enfeites que sem tem em casa.

Acho bonito quando as pessoas encontram meios de dizer umas às outras que se gostam sem precisar das palavras, não de todo prescindindo-as, mas utilizando-as como a coroação de um gesto, o anjo dourado culminante no topo da árvore, resplandescente de beleza e significado.

Hoje estou quase acabando um livro, que ganhei de aniversário da Bia, e que me emocionou porque seria um livro que eu escolheria, e que veio com uma dedicatória adorável e sincera ("...eu não teria te aguentado quase 10 anos em vão.").

Mas o mais emocionante do livro, que eu recomendo veementemente, é a descrição de uma cena de amor, uma das poucas cenas em que a emoção não é raiva ou nojo ou inveja ou desejo de vingança, em que os amantes se encontram e se declaram um para o outro sem que, em qualquer momento, o autor usasse do clichê-mais-que-clichê "eu te amo".



Da página 167. "Ela retribuiu seu olhar, deslumbrada com a consciência de sua própria transformação e maravilhada com a beleza de um rosto que o hábito de toda uma existência a ensinara a ignorar. Cochichou o nome dele como uma criança que experimenta os diferentes sons. Quando ele respondeu com o nome dela, parecia ser uma apalavra nova - as sílabas permaneciam iguais, o significado era diferente. Ele pronunciou as três palavras simples que nem toda a arte barata e toda a má-fé do mundo conseguem trivializar de todo. Ela as repetiu, com exatamentea mesma ênfase sutil no verbo, como se fosse a primeira pessoa a pronunciá-las na hustória. Ele não tinha crenças religiosas, porém era impossível não imaginar uma presença ou testemunha invisível ali, não acreditar que essas palavras pronunciadas em voz alta eram como assinaturas num contrato invisível." (Ian McEwan, em Reparação).

2 comentários:

Anônimo disse...

Que feliz que estou que meu livro te fez bem.
Eu sabia que tu saberia mais que ninguém interpretar a minha dedicatória.
Bem, eu vou ser clichê agora: eu te amo, minha doce Blondie, às vezes Reddie.

Anônimo disse...

lindo, cris. tuas palavras e o trecho.